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Mostrando entradas de enero, 2005

Populismo, política, medo e cristianismo

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A mim o conceito de políticos cristãos dá-me arrepios e jamais me ocorreria votar num partido político que pretendesse moldar a Constituição e a democracia à sua particular leitura da Bíblia. Sei que noutros lugares se vive de maneira diferente, mas na Europa temos certa alergia a este tipo de propostas, já que a experiência histórica não tem sido boa. Por outra parte, como a maioria das políticas cristãs estão baseadas em reafirmar os direitos dos homens heterossexuais brancos, ricos e conservadores, um homem gay como eu vive-as como uma ameaça. E finalmente opino que, se a estratégia mais evangélica de transmitir as boas novas de Jesus passasse por ter o poder político suficiente para as poder impor, o próprio Deus teria feito nascer Jesus na casa do Imperador César Augusto.

Os pais com que o bispo Xavier Novell sonha

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Hoje escutava na televisão que numa homilia dominical o bispo católico Xavier Novell tinha relacionado a homossexualidade com a falta de uma figura paterna. Como é habitual os meios de comunicação ficaram-se só pelo título, e eu estava interessado na parte mais profunda do sermão que continha tamanho absurdo. De todas as formas pareceu-me bastante revelador que, para este senhor, o mundo seja uma coisa exclusivamente de homens. Não há mulheres lésbicas, nem mães, nem avós, nem tias... A única coisa que falta ao bispo são homens como Deus manda que exerçam o papel de pais sem se deixar avassalar nem esfumar (pela feminilidade?). Homens que ocupam tudo, desses de ordem e comando, dos que estão convencidos que Deus deu às mulheres um papel distinto e complementar ao seu (o da invisibilidade).

"Não podes entender a Bíblia se não aceitas a diversidade". Entrevista a Thomas Römer

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Thomas Römer É professor de Bíblia hebraica na Universidade de Lausana e desde o ano de 2007 ocupa a cátedra "A Bíblia nos seus contextos" no “Collège de France”. É membro da « “Académie des inscriptions et belles-lettres” desde 2016. Consideram-no um dos principais especialistas do mundo em Bíblia hebraica, o que tem a dizer aos que afirmam que os grandes especialistas cristãos na Bíblia situam o cristianismo no cérebro em vez de no coração? Não deveria haver antagonismo entre "cérebro" e "coração". É importante entender historicamente a formação dos textos que se converterão, então, na Bíblia, para perceber que esses textos provêm de contextos históricos concretos e que é impossível reivindicar esses textos como verdades atemporais. Mas isto não excluiu em absoluto a sua leitura de una maneira espiritual ou religiosa.

Relendo a história javista da criação

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No livro do Génesis encontramos duas histórias diferentes que explicam a criação do ser humano. A primeira encontramo-la no capítulo um [1] , e faz parte do que se denomina  tradição sacerdotal [2]  (fonte P); enquanto que a segunda aparece nos capítulos dois e três, e provem da  tradição javista [3]  (fonte J). Muitas pessoas fazem uma leitura literal destas histórias, ou pelo menos isso é o que dizem, porque relendo esta tarde a segunda, que relata o ocorrido no jardim do Éden, assaltava-me um mar de dúvidas e perguntas. 

Entrevista a Andrés Gioeni: “Já me deixei de discursos de infelicidade e de vitimazação de Igreja. Hoje caminho com firmeza no meu casamento e olhando para o futuro".

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Andrés Gioeni ordenou-se sacerdote no ano 2000, um ano depois deixou os hábitos. Desde então tem trabalhado como modelo e ator, escreveu vários livros, casou-se com Luís e abriu o canal do YouTube “Libertando Consciências”  ... Reconhece que o seu caminho não foi fácil, mas transmite felicidade, segurança e sobretudo muita vontade de fazer da fé cristã uma ferramenta de libertação. Nesta entrevista fala-nos de tudo isto, com naturalidade e segurança, reconhecendo, ainda, que continua à procura e que o seu caminho continua. 

Do pecado e da graça ao amore à empatia

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Há vezes que de repente, não sabes muito bem porquê, percebes coisas que até esse momento te passavam inadvertidas. Ocorreu-me ontem, sentado no banco da igreja, depois de cantar um cântico que se projetava sobre a tela que há na parede central da igreja. Um cântico novo, se o comparamos com os hinos do século XVII e XVIII que aparecem no hinário que naquele momento tinha entre mãos e que falava de um Deus de amor que se preocupa comigo e expressava também o agradecimento e o amor que sinto por ele.

A “Sola Fide” e a salvação gay

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O heterocentrismo cristão, e mais concretamente o evangélico, tenta apoderar-se das “Cinco Solas” erguendo-se como seu único destinatário e administrador. Para isso criou uma ideologia que converte a “Sola Escritura” (Somente a Escritura) numa lei que persegue e condena as identidades ou afetividades não normativas. A “Sola Gracia” (Somente a Graça) reserva-a para aqueles que anteriormente “circuncidaram” os seus desejos e sentem ou atuam como heterossexuais. Quando diz “Solo Cristo”, (Somente Cristo) adora um ídolo construído à sua imagem e semelhança, esquecendo a mensagem e a vida de Jesus de Nazaré que se situou sempre ao lado dos “outros”, dos deserdados e daqueles que sofriam marginalização. A afirmação “Somente Glória a Deus” complementa-a com o esclarecimento de que os nossos corpos e desejos dissidentes jamais poderão glorificar o Criador. Contudo, é o princípio da “Sola Fe” o que com mais clareza resiste à sua apropriação e à sua tentativa de manipulação.

Como um cristão insensato

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A carta aos Gálatas é conhecida como  “a carta da liberdade cristã” , talvez porque isso é o que está em jogo nas comunidades a que vai dirigida. Carta completamente atual num contexto como o nosso, onde às vezes se afirma a liberdade cristã para depois a afogar com inumeráveis condições. Os judaico-cristãos das comunidades gálatas, muito mais próximos da teologia tradicional do seu tempo que Paulo, defendiam como ele a liberdade; contudo a sua liberdade só podia ser vivida corretamente submetendo-se à Lei.

Paradigmas, homossexualidade e cristianismo

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Em todas as igrejas existem pessoas lgbti, nada faz pensar que a percentagem seja diferente que no resto da população. Por essa razão o cristianismo, como a própria vida, também é lgbti, ou melhor dito, também se vive a partir de uma orientação sexual ou de género não normativa. Além disso, não é algo de novo, sempre houve pessoas lgbti nas igrejas, desde a sua origem. Não há nenhuma indicação na Bíblia que nos faça pensar que Jesus só escolheu discípulos e discípulas heterossexuais, ou que as multidões que o seguiam formavam parte de uma espécie de “ apartheid heterossexual” . Nem ao ler os evangelhos podemos afirmar que Jesus teve uma atração sexual e afetiva para com as mulheres. A probabilidade de que Jesus fosse gay é a mesma que a de qualquer outro ser humano, já que segundo a tradição cristã Jesus foi feito em tudo igual a nós.

Uma vida no sofá

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Estou em casa da minha mãe, sentado no sofá, enquanto ela brinca com as netas ao meu lado. Deixo-as, às três, e a minha mente retrocede décadas sem se mover nem um centímetro do sofá, ou do que havia, então, no seu lugar. Teria eu oito ou nove anos e recordo que gostava de saltar para cima dele. Também o utilizava para me sentar, sobretudo quando a minha avó me explicava como fugiu de casa quando era jovem para ir viver com o homem que queria porque os seus pais não aceitavam a relação. Às vezes, enquanto fazia croché, contava-me outras histórias apaixonantes: sobre uma guerra que a mim me parecia longínqua, do meu avô na prisão, condenado à pena de morte, mas indultado no último momento, ou de ela tentando sobreviver com um bebé de poucos meses numa aldeia de Granada. Apesar de que do que mais me recordo, é de que tínhamos que ler a Bíblia todos os dias depois de chegar da escola. Recordo-me disso, porque me parecia eterno. Eu, a única coisa que queria era acabar rapidamente para

Não é homofobia mas o literlismo bíblico

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Depois de ter falado com muitas pessoas LGTBI que procediam de igrejas evangélicas, dei conta de que nenhuma delas tinha interesse em conhecer os argumentos com os quais poderia rebater a homofobia de que padeciam dentro das suas famílias ou comunidades. Nunca ninguém me perguntou: Que posso dizer-lhes para que se dêem conta que a homofobia é um pecado? Pode parecer surpreendente, mas ainda que maioritariamente tenhamos varrido os sentimentos de culpa, a verdade é que nunca conheci um evangélico LGTBI, por muito conservador ou fundamentalista que fosse o ambiente do qual procedia, que não tivesse claro que era objeto de um ódio e discriminação que Jesus tivesse rejeitado.

Uma fé pequena

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Hoje, não é fácil acreditar em Deus, não é fácil. Não é simples afirmar que lhe interessamos, que ainda tem um mínimo interesse por este mundo louco em que vivemos. Sempre nos movemos numa zona perigosa, onde corremos o risco de perder essa fé que, não sabemos bem porquê, nos acompanha sempre. Talvez não haja outra maneira de acreditar, digo às vezes para mim, talvez seja isso no máximo que podemos aspirar: ter uma fé pequena, débil e totalmente dependente de um Deus que, se existe, será capaz de nos acompanhar e perdoar se algum dia já não podermos crer n’Ele.

Entre o luto e a alegria

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Impressionou-me a forma como Lorca fala sobre a repressão na sua obra: “A casa de Bernarda Alba”. Uma repressão que descreve em forma de mulher; Cinco irmãs que, após a morte do seu pai, são condenadas por Bernarda, a mãe, a viverem fechadas na casa durante oito anos e a vestir de um preto rigoroso: “Em oito anos que dure o luto não há de entrar nesta casa o vento da rua. Faremos de conta que tapamos com tijolos portas e janelas” E é que como afirma  Bernarda: “Isso tem que ser uma mulher”. (1)

Via Sacra em direto

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O assassinato de Jesus não teve nada de especial, nenhuma das pessoas que o viram passar arrastando uma cruz pensaram que aquele era um momento único na história da humanidade. Enquanto Jesus se comportou como um pregador itinerante mais ou menos provocador na Galileia, a sua vida não correu perigo, mas quando se atreveu a enfrentar-se em Jerusalém com os poderes do seu tempo, o religioso e o político, acabou morrendo como muitas outras pessoas incómodas acabaram ao longo da história. Os discursos libertadores têm o percurso que têm e são eliminados quando o poder os considera demasiado perigosos para a sua sobrevivência.

“A IGREJA PADECE DE HOMOFOBIA: NECESSITA UMA TERAPIA DE CONVERSÃO”. Entrevista a Krzysztof Charamsa

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Há pouco mais de quatro meses que  "saiu do armário"  e em tão pouco espaço de tempo perdeu o seu trabalho como professor de teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma, foi afastado das suas funções como secretário adjunto da Comissão Teológica Internacional e de oficial da Congregação para a Doutrina da Fé, encheu primeiras páginas de jornais, participando em programas de televisão e rádio, e veio mesmo viver para Barcelona. Como se sente neste momento? Como avalia o que lhe aconteceu a nível pessoal? Sinto-me cristãmente libertado e realizado. Penso que esta foi a verdadeira boa “passagem” ( metanoia ) da minha vida espiritual – uma verdadeira páscoa da minha ressurreição. Para mim foi também o cumprimento da minha missão como sacerdote. Paradoxalmente, quando as instituições católicas me impuseram a proibição de exercer o ministério, em consciência sinto que justamente agora amadureci a verdadeira fidelidade à minha vocação como pessoa homossexual cham

REFLEÇÕES SOBRE EROTISMO E FÉ CRISTÃ

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O erotismo serviu em muitas ocasiões para expressar a relação entre Deus e o ser humano. Na tradição judaico-cristã o exemplo mais conhecido encontramo-lo no livro do Cântico dos Cânticos, uma obra com claras referências sexuais desde os seus primeiros versos: “Que ele me beije com beijos da sua boca! Melhores são as tuas carícias que o vinho, ao olfacto são agradáveis os teus perfumes; a tua fama é odor que se difunde. Por isso te amam as donzelas. [1] ”. Apesar de que Deus não aparece citado no Cântico dos Cânticos, foi a interpretação alegórica a que conseguiu que esta obra se introduzisse no cânone. Desta maneira o amado passou a se identificar com Deus e a amada com o seu povo (Israel em primeira instância e mais tarde a Igreja). Mas por muito que se dê prioridade à interpretação alegórica, não deixa de surpreender por exemplo que um Deus (homem) queira prender os peitos de uma Igreja (mulher) que lhe promete beijos y carícias. E ainda que a referência à heter

OUTRA LEITURA DE EFÉSIOS 2,1-10

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Todo o texto de Efésios 2,1-10 fica sintetizado em pouco mais de um versículo, concretamente nas frases:  “porque é pela graça que estais salvos, por meio da fé. E isto não vem de vós, é dom de Deus; não vem das obras, para que ninguém se glorie”. Donde se destacam quatro palavras sobre as quais parece girar toda a reflexão: graça, salvação, fé e obras. As interpretações que se fazem deste texto são diversas já que cada uma delas nasce de uma pergunta distinta e portanto, dá prioridade a uma destas palavras sobre as outras três.

A YIHAD DE MUÇULMANOS E CRISTÃOS

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Desde 2014 ISIS conquistou várias zonas da Síria para estabelecer um suposto  “califado”  de que a cidade de Raqqa é capital. A vontade deste grupo terrorista é estabelecer um Estado Islâmico que abarque todo o mundo árabe e a partir dele conquistar o resto do mundo. A yihad é o grito de guerra com o que pretendem atrair jovens muçulmanos que se sentem excluídos e desenraizados em países ocidentais. É o grito com o que decapitam, crucificam ou lançam do alto de edifícios todo aquele que mostre uma suspeita de dissidência em Raqqa, ou com o qual semearam o terror e a morte há uns dias em Paris. Não interessa se para isso têm que se imolar, a yihad promete-lhes uma vida no paraíso rodeados de doze donzelas a cada um deles, e um só homem para elas, para que sejam satisfeitas. 

HOMOCRISTIANUS EVOLUTIS: Para onde estamos evoluindo?

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Os cristãos homossexuais são diversos, mas é fácil observar que existe uma evolução na maneira como se entendem a si próprios, e a forma como relacionam a sua orientação sexual com a sua fé. Podemos dizer que atualmente coabitam diferentes “ Homocristianus” e que muitos deles estão evoluindo para estados superiores de desenvolvimento. Talvez em pouco tempo alguns estados primitivos teriam já desaparecido, e haverá outros e outras “ Homocristianus”  aos que lhes custará entender qual foi a razão pela qual durante tanto tempo existiram cristãos e cristãs homossexuais que viviam a sua fé de outra maneira.

DUAS FAMÍLIAS HOMOPARENTAIS CRISTÃS: REFLEXÕES E EXPERIÊNCIAS.

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Testemunho de Carlos Osma e Esther Baruja Carlos Osma (CO) : Grávidas! Felicidades às duas. Suponho que o caminho para aqui chegar não começou só há uns meses. Quando planeaste pela primeira vez que querias ser mãe? Imaginaste naquele momento que partilharias a maternidade com outra mulher? Esther Baruja (EB) : Obrigado! Kati e eu estamos muito contentes. Começámos a pensar ter filhos desde que começámos a nossa relação há 10 anos, mas nessa altura não falávamos de gravidez mas de adoção – que algum dia ainda desejamos fazer. Com o tempo fomos recolhendo mais informação sobre a gravidez com dador, primeiro em Buenos Aires onde vivemos uns anos e onde contactámos com uma clínica de fertilidade e um banco de esperma pela primeira vez. Sempre gostei de crianças, sempre quis ter filhos/as próprios, nunca, contudo, estive muito de os querer parir! (ahah). Antes de estar com Kati nem sequer imaginava uma vida possível fora do armário, a questão da maternidade estava simple