Os pais com que o bispo Xavier Novell sonha
Hoje escutava na televisão que numa homilia dominical
o bispo católico Xavier Novell tinha relacionado a homossexualidade com a falta
de uma figura paterna. Como é habitual os meios de comunicação ficaram-se só
pelo título, e eu estava interessado na parte mais profunda do sermão que continha
tamanho absurdo. De todas as formas pareceu-me bastante revelador que, para
este senhor, o mundo seja uma coisa exclusivamente de homens. Não há mulheres
lésbicas, nem mães, nem avós, nem tias... A única coisa que falta ao bispo são
homens como Deus manda que exerçam o papel de pais sem se deixar avassalar nem
esfumar (pela feminilidade?). Homens que ocupam tudo, desses de ordem e comando,
dos que estão convencidos que Deus deu às mulheres um papel distinto e
complementar ao seu (o da invisibilidade).
De todas as maneiras, se o bispo Novell fosse
medianamente inteligente e acreditasse realmente no seu absurdo comentário,
seria melhor para a sua diocese (que cada vez tem menos vocações e há anos que
não ordena sacerdotes) acabar com a paternidade que ele gosta. Digo-o porque, embora
não haja dados fiáveis, alguns estudos apontam a que pelo menos 30% dos
sacerdotes são gays, percentagem que aumenta até 50% no Vaticano segundo
Krzysztof Charamsa. Assim que, se pensar bem, a próxima vez que se encontre
frente a um protesto LGTBIQ, em vez de ser escoltado até um magnífico
carro para fugir o antes possível, deveria aproximar-se tranquilamente para os evangelizar
(ou para deixar-se evangelizar). Na população LGTBIQ, tem uma potencial camada de
jovens sacerdotes. Além do mais se estão a gritar e a saltar em frente à igreja
um domingo pela manhã, em vez de estar a dormir como o resto dos mortais da sua
idade, é porque é gente comprometida, que tem ideais e luta por um mundo melhor.
Se algum dia se atrever a fazê-lo, recomendo-lhe que antes de mais, comece por lhes
pedir perdão, ninguém gosta que insultem o seu pai.
Gostaria, também, de recordar ao bispo (já que tomou a
liberdade de falar da minha família) que segundo o Novo Testamento [1], entre as características
que deve ter um bispo está a de ser uma pessoa equilibrada e hospitaleira. E
creio que ficou muito claro que nesta ocasião não foi nem uma nem outra coisa. Por
um lado, porque se fez porta-voz de uma ideologia marginal que durante décadas culpabilizou
as pessoas LGTBIQ e que há tempos que foi desmentida; e por outro, porque com essas
palavras está a convidar muitas pessoas a abandonar a igreja. Isso não é ser um
bom bispo, já que em vez de oferecer o sacramento da reconciliação entre todas
as pessoas a quem serve como pastor, promove o enfrentamento e a marginalização.
Não conheço o pai do bispo e nego-me a devolver o
insulto, espero que tenha sido um bom pai. Mas o que tenho muito claro é que, para
além de ser filho, a Xavier Novell ficava-lhe ter seguido o conselho que dá o Novo
Testamento aos bispos: estarem casados e terem uma família. Se tivesse sido pai
ter-lhe-ia sido mais difícil julgar outros pais e mesmo poderia entender melhor
o seu. Quando alguém se atreve a falar de coisas que desconhece, é fácil meter o
pé na poça. Ser filho não é fácil, mas ser pai, também não, e o que deveria
fazer o cristianismo era acompanhar todas as famílias e não estigmatizar nenhuma.
E se quer ter um modelo de pai ausente, não necessita de ir muito longe da sua
igreja, ou de insultar os pais que têm um filho gay, que olhe para o Cristo
crucificado da sua igreja e recorde as suas palavras: “Meu Deus, meu Deus,
porque me abandonaste”.
Carlos Osma
Tradução de Aníbal Liberal Neves
Notas:
Artigo original (Publicado en maio de 2017) : "Los padres con los que el obispo Xavier Novell sueña".
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